Um blog onde pretendo discutir economia, política, cultura e história tudo sobre a visão de quem vive em Sergipe.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Pensamento do Dia

A fome não é mais do que a expressão biológica de um fenômeno econômico. A fome é, regra geral, o produto das estruturas econômicas defeituosas e não de condições naturais insuperáveis.

Josué de Castro, autor do clássico "Geografia da Fome"

A polícia e seus símbolos

Na semana que passou eu dirigia o meu “possante” Corsa 1000 com destino à GAZETA. Em minha frente, observei um carro da polícia. Era um Santana, novinho, reluzente e bem conservado. Contrastava com as “viaturas” da polícia que estamos acostumados a ver circulando por aí, normalmente velhas, batidas e mal cuidados. Mas o que chamou mesmo a atenção foi o símbolo, ou brasão, sei lá, que tomava todo o vidro traseiro do Santana. Era o distintivo da GARRA, o Pelotão de Choque da PM. O tal distintivo consistia em duas metralhadoras cruzadas, encimadas por uma caveira estilizada, bem grande.
Comecei a pensar cá com os meus botões, porque símbolo da polícia tem que estar ligado a armas, caveiras, e coisas do gênero? Porque será que o pessoal da polícia acha que deve ter esta ligação visceral com a morte? Será que é bonito empunhar armas? Ter caveiras como distintivos? Ao que possa lembrar, o símbolo da caveira tremulava nas bandeiras negras dos navios piratas. Mas estes, não eram, nem de longe, homens da lei. Ao contrário, eram os bandidos mais perigosos de então.
Cruzando os dados, comecei a meditar sobre o porquê das tentativas da tal polícia cidadão não terem dado os resultados esperados. E cheguei a uma conclusão que não sei se é a correta, mas pelo menos, na minha ótica, é lógica: Uma polícia que tem como os seus símbolos, armas, caveiras e mortes, não está preparada para ser uma polícia cidadã. É uma questão cultural, que necessita ser enfrentada. Portanto, qualquer trabalho de mudança da polícia, deve começar pela mudança da sua filosofia. O primeiro passo é não permitir que símbolos como esses possam ser ostentados por aí. Eu ia até perguntar porque o símbolo da GARRA, por exemplo, não poderia ser uma flor. Mas já sei que aparecerá algum “sargentão” para dizer que estou propondo uma polícia de maricas (mero eufemismo, o nome que ele vai dizer é outro), e que polícia é coisa do macho, etc....Bom, a questão é cultural mesmo.
Mas voltando à caveira. Será que a população vai cofiar numa instituição cujo ideal são as armas, a morte, a violência? Eu acho serenamente que não. O foco pelo qual a polícia enxerga a sua missão é que necessita ser alterado. A polícia é feita, e deve estar convencida disso, para proteger a população. A polícia não existe para prender ou matar bandidos. Prender ou matar, é uma conseqüência extrema da proteção à população. O cidadão deve ser o alvo da polícia. Deixe eu explicar melhor essa história, ou vão dizer que quero que saiam por aí atirando no povo. O cidadão deve ser a razão de ser da polícia. Garantir a sua proteção, a sua segurança, o seu bem estar, é a razão de ser da polícia . A própria polícia precisa compreender que, combater a marginalidade, não é finalidade por si só. Parece bobagem ou tautologia, mas não é. Combate-se o marginal, para que o cidadão comum, o homem de bem, tenha tranqüilidade.
Um exemplo para mostrar como a mudança de foco é importante. Hoje, um policial, seja aqui seja onde for no Brasil, não deixa um bandido fugir. Atira mesmo, não dando a mínima para o no perigo, ou a importância, que seu ato de disparar uma arma teve. Se a visão fosse inversa, todos teriam a certeza que é melhor deixar um bandido fugir do que atirar e atingir um inocente. O que não é possível com a visão atual da polícia. É por isso que existem as tais balas perdidas e outras coisas do gênero. É por coisas como estas que a população, de modo geral, teme a polícia. Não seria muito mais fácil se a população respeitasse e admirasse a sua corporação policial do que a temesse?
Só um exemplo. A cidade de Nova York tem uma das polícias mais corruptas do mundo. Na década de 70, o bairro do Bronx era um dos mais violentos da cidade. Favela do Rio de Janeiro poderia ser considerado um local tranqüilo, perto do que acontecia por lá. Quando a guerra entre gang’s, ou a ação dos bandidos recrudescia, a população ia passar as noites na delegacia. Era o único lugar que sabiam estar seguros. A delegacia do Bronx ganhou o nome de Forte Apache, lembrando o famoso filme de faroeste, onde Henry Fonda é o comandante do forte que é sitiado pelos índios. A delegacia vivia cercada pela marginalidade, mas a população sabia que podia contar com a polícia. Por falar em cinema, o episódio gerou até um bom filme policial, com o nome Forte Apache – Bronx.
Será que a população de Sergipe se atreveria a procurar proteção num quartel da PM, ou numa delegacia da Polícia Civil?


Este artigo foi publicado na Gazeta de Sergipe na edição de 13/06/2000